“Criar é trazer à existência algo que antes não existia. pode ser uma conversa, a solução de um problema, um bilhete para um amigo, a reorganização da mobília da sala, um novo caminho para casa a fim de evitar engarrafamento”
Toda minha infância na casa de voinha foi analógica, a geração dos anos 80 que brincava no jardim caçando insetos e folhas pra cozinhar em potes de margarina. Percebíamos o tempo, as cores, as pequenas manifestações da natureza, criávamos brincadeiras.
Rick Rubin, em seu livro O Ato Criativo: uma forma de ser, nos lembra que o universo é um grande desdobramento criativo, e assim como o passarinho faz o ninho e as árvores dão frutos, nós humanos, somos capazes de criar muitas coisas. Enquanto somos “filhotes” já criamos coisas. Crescemos e vamos criando muito mais, fazemos parte de um grande cronograma cósmico, somos parte de um universo criador.
Numa abordagem mais holística, mas que pra mim, faz muito sentido, Rick diz que somos antenas de pensamentos criativos, onde algumas transmissões chegam mais fortes, outras mais fracas, e que é preciso de um esforço pessoal pra sintonizar a sua antena e não se distrair com tantos ruídos.
Vamos combinar que barulho não nos falta. Como teremos uma mente criativa com tantas informações nas redes sociais? Com horas e horas diárias de trabalho? Com demandas domésticas, filhos e crises de ansiedade? Como podemos nos conectar com a sabedoria do universo para criar uma obra de arte, um almoço no fim de semana, um negócio ou uma decoração que nos traga satisfação com a nossa casa? Como sintonizar nosso eu com todas essas energias? O modo da nossa sociedade capitalista nos limita quando rouba nosso tempo e atenção, mas ainda assim, a nossa criatividade é exercida em cada resolução que encontramos na nossa rotina.
Não sei como você lida com a artista que mora em você, mas eu também acreditei não ser uma pessoa criativa, era mais confortável que as pessoas pudessem escolher ou fazer por mim. E esse pensamento me levou a abandonar projetos pessoais e profissionais nos últimos anos.
Voltando ao barulho da sociedade moderna, Rick diz então que a relação que temos com a natureza é muito mais energética que tátil, sentimos a natureza de uma forma muito mais intuitiva que de maneira consciente. Então o primeiro passo talvez seja resgatar aquela sua versão criança no jardim da casa da vó.
Lembrei dessa música cantada pela maravilhosa Gal Costa, uma música de resistência, que também pode se aplicada em nosso contexto :
Atenção ao dobrar uma esquina
Uma alegria, atenção, menina
Você vem, quantos anos você tem?
Atenção, precisa ter olhos firmes
Pra este sol, para esta escuridãoAtenção
Tudo é perigoso
Tudo é divino, maravilhoso
Atenção para o refrão, uau!É preciso estar atento e forte
Não temos tempo de temer a morte
A nossa criança é muito mais aberta para novas ideias, aceita novas informações com satisfação e curiosidade, ao invés de fazer comparações. Ela é espontânea, curiosa e não sente-se cansada constantemente. Uma pessoa criativa consegue conservar essas qualidades. Preste mais atenção, diminua o barulho dos nossos tempos.
A Fonte da criatividade está em todos os lugares, nós a sentimos ou entramos em sintonia com ela, através das nossas experiências, mas também por meio dos nossos sonhos, da nossa intuição e de outros fatores ainda desconhecidos, “encontram o caminho para dentro de nós”.
A Julia Cameron, em o “Caminho do Artista”, diz “Assim como o sangue é uma realidade do seu corpo físico – e não uma invenção – a criatividade é uma realidade do seu corpo espiritual – e não fruto da sua imaginação. Ela dedica as primeiras páginas de seu livro a falar sobre a eletricidade espiritual. Se você pensar no Universo como um grande oceano de energias, onde você faz parte, abrir-se à criatividade faz com que você deixe de ser alguma coisa à deriva no mar para se transformar numa parte muito mais funcional, consciente e cooperativa do ecossistema.
A sua artista é uma criança interior, que vive sintonizada com a fonte e está sempre atenta aos pensamentos infantis.